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15.4.12

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Tinha chegado de férias. Encontrou o seu local de trabalho completamente diferente. Em vez da caixa de quatro paredes, com janelas mínimas, que rodeavam os cerca de 100m2, encontrou as pessoas e os aparelhos instalados à beira dum rio. Ao longe, a espreitar na curva do curso do rio, viam-se alguns edifícios modernos, envidraçados, com muitos andares. Perguntou que cidade era e responderam-lhe que era o Porto. Bem lhe tinha parecido! Agora tinha que encontrar a ordem de tudo aquilo. Não podia contar com a ajuda de ninguém, já sabia isso. Estava espantada com a mudança mas a vida tinha-lhe ensinado que tinha que estar preparada para tudo! Então começou a explorar, a tentar encontrar o seu lugar. As escarpas do rio eram acentuadas e com uma vegetação luxuriante. Pareceu-lhe que os vários departamentos estavam acomodados em escadinha no meio da vegetação nessas escarpas e também ao longo do rio. Havia também uma ou várias pontes rústicas a atravessar o rio. Encontrou uma colega que a tratou com indiferença só parando quando se lembrou de lhe colocar uma questão técnica que, de tão especifica, precisava de estudo prévio. Não sabia a resposta mas sabia que a questão era só para a deixar incomodada com a suposta ignorância. A colega foi embora com a pressa de quem supostamente tem muito que fazer. Tentou não ligar muito a este episódio, afinal tudo era diferente menos esta atitude. Tratou de explorar o espaço. Não havia caminhos definidos para subir. Tinha que se encontrar o trilho. Então foi subindo afastando as ervas e arbustos. Chegou a um patamar onde havia uma encosta de areia. Nalguns sítios dessa encosta percebia-se que servia de passagem mas noutros, menos que os anteriores, não: estava perfeitamente lisa e a inclinação convidava a derrapar por ali abaixo. Pensou duas vezes em utilizar aquele caminho para chegar a um outro patamar mais abaixo que lhe daria acesso a uma pequena cabana que através duma pequena janela lhe permitiria chegar a um planalto de respeito, muito mais acima que todos os outros. Decidiu fazê-lo. Entregou-se àquele pequeno prazer em contrapartida ao esforço que tinha sido subir a pulso por entre a vegetação. Depois o vento tornaria a repor cada grão de areia no seu lugar. Quando chegou ao fundo duas senhoras muito sofisticadas, que estavam de costas, viraram-se e fizeram uma cara de quem não queria acreditar. Estavam a planear qualquer coisa para aquela encosta de areia perfeita e agora viam tudo estragado. Fizeram-na sentir muito mal e teve que pedir várias vezes desculpa apesar de considerar que não se justificava tal atitude. Continuou, trepando então à janela da pequena cabana. Depois agarrou com força dois pequenos arbustos que estavam mais acima a descair do planalto, fez força com o seus braços e o seu corpo (e a sua alma) e conseguiu alcançar esse outro patamar. Ficou pasmada com o que encontrou. Ali havia mais pequenas construções dispostas em ilhas, que comunicavam entre si, num grande lago como numa paisagem chinesa maravilhosa. Tudo era harmonioso e quase perfeito. Entrou numa pequena construção e viu algumas pessoas suas conhecidas a trabalhar. Não foram especialmente simpáticas com ela. Não importava. Ela sabia que nunca ninguém tinha sido simpático para elas e por isso talvez não soubessem sê-lo para os outros. Voltou a olhar em todas as direcções pelas janelas rasgadas e mesmo de cá de fora e nunca se cansava. Estava sempre a encontrar coisas novas. Aquela paisagem trazia-lhe uma paz e ao mesmo tempo uma excitação à alma. Pelo espanto. Não sabia bem como explicar.